Depois do RDP, Inocentes, Garotos Podres e Replicantes, faltava apenas uma banda clássica dos anos 80 a pisar em solos paraoaras: Cólera, uma das primeiras bandas punks do Brasil (Olho Seco não conta, pois já acabou).
Lembro quando comprei, em 1985, pelo correio, o Sub, segunda coletânea em vinil de punk do Brasil (a primeira foi o Grito Suburbano e ambos continham o Cólera). Fui o primeiro a ter esse disco na cidade e ele foi meu cartão de entrada no pequeno movimento punk que insurgia por esses lados.
Lembro também que décadas depois, várias pessoas tentaram trazer o trio liderado pelo vocalista/guitarrista Redson: Azul (do blog Música Paraense.Org); Del (do festival Rock Contra a Fome) e eu mesmo, que insisti por dois anos com o Marcelo Damaso para ele trazer a banda para o Festival Se Rasgum.
Foi preciso o jovem e articulado Kaká (do selo Xaninho Discos Falidos e integrante das bandas Derci Gonçalves, Primos de La Beata e Escárnio), que nos anos 1980 deveria ser um bebê, para concretizar o mesmo. Isso com a ajuda de poucos amigos, colaboradores e apoiadores, num sistema totalmente Do IT Yourself.
A espera foi longa. Para mim e para amigos que não víamos há anos em shows, que se mesclaram com velhos e novos fãs, resultando num crossover de seres diversos que se aglutinaram no Açaí Biruta no dia 19 de março.
Com o salão não tão cheio (maldita chuva), Nó Cego começa as ainda tímidas rodadas de pogo com seu punk rock ramonizado. Contando agora com André Formigosa na bateria, a banda mostrou que um bom punk rock é como um bom vinho: Quanto mais velho e quente, melhor. O veterano baixista Cláudio Darwich agita como um adolescente (mostrando o vigor que manteve de sua antiga banda Insolência Públika, aliás, a primeira punk da cidade), enquanto seu irmão, Sérgio Darwich (o Seu Madruga do punk-rock paraense), destila suas letras ácidas e irônicas, marca registrada deles. Impossível não notar do mezanino/camarim, de onde eu estava nessa hora, Sérgio Barilow, primeiro baterista do Nó Cego, e que organizou shows memoráveis na cidade nos anos 1980 como Rock 1 (no saudoso teatro Waldemar Henrique) e Clube do Rock (no extinto Lapinha), curtindo sua ex-banda.
Delinquentes é a seguinte. O som estava porrada e alto e pela primeira vez ali naquele local ouvíamos bem o retorno. Segundo alguns amigos, os timbres da guitarra e baixo estavam pesadíssimos, o que combinou bem com nosso estilo crossover, embora tivéssemos preparados um repertório mais hardcore. Notei que o Pedrinho (GT) estava mais empolgado que o de costume, deixando-o mais solto para soltar seus riff’s afiados à vontade, enquanto Raphael (BT) e Pablo (BX) seguravam a base com a firmeza que lhes é peculiar. Alguns amigos e fãs não iam a nossos shows há anos e eles demonstraram saudades, cantando as músicas conosco e com nosso público habitual.
Com a eficiente produção de palco do Azul, tudo era bem rápido e chega a vez do Licor de Xorume. Com uma grande responsabilidade nas costas, de abrir para o Cólera, a banda não decepcionou, logo botando a galera mais hardcore para pogar com seu som direto e agressivo. Levaram covers clássicos como Inocentes, Olho Seco e Psychic Possessor. Impossível ficar parado. Mostraram também sua cara própria com músicas com fortes refrãos como “Filhos de Eldorado”. O baterista Daniel tem uma pegada segura e notei que o Fabrício está com um vocal bem mais raivoso que antes, dando um puta gás extra à banda. Com dez anos de estrada, o Licor de Xorume mostrou ter uma grande empatia com seu público.
Mas tudo isso era apenas um aperitivo para o prato principal do dia, de um banquete de punk rock saudosista que apenas começara. Com os primeiros acordes do Cólera (saudando a nossa região com a intro tribal de “Qual a Violência?”), a galera botou a poeira pra subir, provando que nem só de reggae vive o Açaí Biruta, com verdadeiros clássicos sendo entoados pelo trio. Val (com sua marcação cerrada no baixo), Pierre (que fez escola com sua forte e tradicional batida punk) e Redson (que não para no palco um minuto) fizeram o público pular e cantar suas letras de cunho político-ideológico-social que marcaram uma época. A cada música, o público delirava. E foi assim com “Funcionários”, “Palpebrite”, “Medo”, “Pela Paz”, “Deixe a Terra em Paz” entre outras de todas as fases da banda, que foram ecoando pelo rio Guajará afora...
A emoção era nítida também no gargarejo, onde eu também estava, espremido. De lá pude ver o Azul, Kaká, Sandro-K (Abunai), Jusa Sombra (roadie do Delinquentes que acabou sendo chamado para ajudar a headliner), assim como o fotógrafo do jornal Diário Marcelo Lélis e o próprio roadie do Cólera, Wendell (da banda paulista Sociedade Sem Hino), todos cantando as músicas enquanto trabalhavam no palco. Até os membros da Pró Rock, enquanto produziam seu programa Pará Underground, pareciam estar contagiados.
O show do Cólera é uma aula, pois mostram que com simples acordes bem executados e com uma harmonia ímpar inserida no hardcore, conseguem cativar a muitos. Vale ressaltar a presença de fãs de outros lugares, como Breves, Castanhal e até São Luís e Macapá.
Já eram umas duas da matina quando a banda desceu do palco, e depois de uma rápida ida ao camarim, saíram e bateram longos papos com os sobreviventes, provando que a humildade não se desgastou com o tempo.
Com a alma lavada e um olho roxo (de uma cabeçada que peguei), constatei a nítida satisfação nos rostos das pessoas, incluindo até os apoiadores, como o pessoal do curso Exemplo (que sempre foram fãs do Cólera), Dudú (Davu-K) e o Garapa, que nessa hora já havia largado a banquinha do Veg Casa para curtir.
Como bem disse no microfone na hora de nossa apresentação, mais que um simples show, tratava-se de uma verdadeira confraria. Em que cada um ali presente deu a sua contribuição para que fosse bem sucedido. Desde o público, amigos que ajudaram (alguns até com dinheiro), bandas de abertura, apoiadores, Kaká (pela iniciativa e coragem) e principalmente, pela lenda viva do punk nacional, Cólera, que nos brindou com seus hinos pacifistas, numa festa que não víamos há anos na cena punk rock local. Um brinde a todos nós.
sensacional dr jayme.
ResponderExcluirfoi uma noite q nunca vamos esquecer.
Nó Cego na abertura do Cólera, com grandes amigos e bandas q admiramos, coo o Delinqua e Licor!
sensacional.
com certeza, afetivamente e em todos os aspectos, foi nosso show mais importante.
foi legal rever o Barilow tb.
Dia 9 de abril tem mais Nó Cego, na orla de Icoaraci.
Ainda nao tenho os detalhes, mas qdo tiver aviso o sr e mando a divulgação.
abração ae!
e valeu.
O Jayme parecia criança no park...sua resenha revela todos os detalhes vividos neste dia. Parabéns por sua escrita e seus comentários (sempre justos ao que aconteceu, sem ocultar ou aumentar).
ResponderExcluirParabéns a prorock pela preciosa aquisição...sou suspeita, mas tá valendo...rsrsrsrsrs
Melissa
Valeu Melissa, pelos comentários sinceros, mesmo que suspeitos, hehe. e ao Cláudio também, que admiro desde antes de me meter nesse negócio feio e sujo que é o rock, rsrs. Fazer parte, mesmo que de uma forma pequena, que foi um apoio, nesse show clássico pra mim valeu muito. Tentei passar tudo o que me lembrei nessa matéria, sendo justo à todos que de uma forma contribuíram...
ResponderExcluirMeu amiguinho Jaime eu sou o Carapa e não Garapa,rsrsrsrsr!!!!
ResponderExcluirFoi muito Louco esse evento, eu por muito tempo esperava esse show em Belém, o melhor foi participar apoiando a realização desse show
histórico.
Veg Casa estar aberto à apoiar outros eventos.
hahaha. Valeu Carapa. engraçado que por muito tempo eu troquei seu apelido, mas como o conheço desde os anos 90, você ainda é o brother Frank mesmo. Valeu por estarmos juntos nesse apoio desse evento aí.
ResponderExcluirSensacional
ResponderExcluirParabéns, Jayme!!!! Porra, assisti ao vídeo do Cólera e pedi pra que da próxima vez o mapa encolha... ou o grana aumente pra eu poder ir!!!! Saudades dos Delinquentes!!!! Abraços, guerreiro!!!
ResponderExcluirDavi Kaus, Cultcha! e banda Vitrine
Grande davi KAUS. Boas recordações do povo de taguatinga (DF). Mande um abraço pra todos daí, principalmente pro everaldo ÉÉÉÉGUAAAA!!! hehehehe
ResponderExcluirPra mim o dia 19/03 fica gravado pra sempre na minha memoria, pois pude ver uma lenda viva da minha adolescencia e juventude na minha frente e eu entoando seus hinos frente a frente, que até antes só entoava nos meus vinis, desta que é uma banda q mostra que pra se ter uma longevidade no rock in roll não é ceder aos shows business da vida.
ResponderExcluir"Qual violência é pior, quero um mundo melhor" essa canção ainda ressoa vibrante nos meus ouvidos. Tive o privilégio de ouvir muitos sons durante minha vida, mas ter conhecido os hinos do Coléra ficaram para sempre gravados na minha memória afetiva. Vivíamos numa situação financeira dificílima e meu irmão do meio, ouvia essas canções como esperança para continuar a viver.
ResponderExcluirFoi definitivamente emocionante esse show pra mim. Essas canções fazem realmente sentido em nossas vidas.